Victor Eustaquio - Lisboa
«Si hay un escritor mercenário de causas políticas, ese es Vargas Llosa, pero, aunque respecto al análisis político y económico es un imbécil». Apanhei a frase num curioso fórum de discussão, com uma esmagadora participação de latino-americanos, a propósito da atribuição do Nobel da Literatura ao popular autor peruano. Neste mesmo fórum, há quem mesmo que afirme que «Vargas Llosa sí se acomodó a los grupos de poder político y económicos. De hecho, el premio (o Nobel) es más geopolítico que otra cosa».
Em suma, a tendência dominante que passa por este fórum pode ser traduzida por um outro comentário que nele encontrei: «Vargas Llosa & asociados representan al golpismo y son correa de transmisión del neofascismo. Ubicar a estos personajes en la “derecha” del arco político seria cumplido ideológico. No es grave que haya oposición y escritores de derecha. Lo grave es que la abyección sea plataforma de sus princípios.» Para quem leu algumas das obras mais recentes como «A Festa do Chibo» e, inevitavelmente, «O Sonho do Celta», apenas para citar duas, estava em crer que seria evidente o posicionamento político de Vargas Llosa e o sentido da sua militância a favor de determinadas causas de ordem política, os quais, aliás, julgava eu, haviam recolhido um consenso favorável sobretudo em sociedades que experienciaram a pressão colonial. Contudo, perante estas vozes dissonantes, questiono-me: terei lido bem? Terei conseguido perceber o significado e o alcance ideológico de Vargas Llosa? É que, independentemente da representatividade das opiniões acima citadas, começo a ficar com a impressão de que há, com efeito, sinais de inquietação junto de alguns sectores da opinião pública latino-americana quanto a Vargas Llosa. E isto para não falar nas insinuações veladas, que igualmente tenho encontrado em sites de alinhamento ideológico semelhante, quanto à sua alegada e reprovável orientação sexual (como se essa dimensão também devesse ser lida como um denominador comum para a avaliação da (des) integridade moral e política do autor, quando na verdade Vargas Llosa mais não fez do que retratar uma pessoa real, o diplomata irlandês Roger Cassement em «O Sonho do Celta». Ainda assim, é interessante reflectir e pôr à discussão determinadas indefinições que Vargas Llosa não parece ter resolvido justamente em «O Sonho do Celta»: Llosa, que assume a história na terceira pessoa, como narrador distante e paradoxalmente omnisciente, não hesita em usar termos como 'colonizado' ou 'descolonização' no bloco de texto em que segue o percurso de Cassement pelo ex-Congo Belga. Ora, parece evidente que os congoleses nunca viram o seu desejo de emancipação como 'descolonização' ou a ocupação do território como obra do poder colonial, mas tão somente como 'libertação nacional' ou 'nacionalista' perante 'o agressor branco'. Significa isto que o narrador (Vargas Llosa), ao não pesar este erro de percepção entre a forma como uns e outros vêem o mesmo fenómeno, acaba por colonizar a sua própria narrativa ao produzir uma descrição irremediavelmente. Algo que o autor peruano decerto não preconiza. Ou estaremos errados? Pelo menos, uma coisa é certa: ele, Vargas Llosa, acaba por cair na armadilha. Tal como o cineasta francês Jean-Luc Godard sempre defendeu, antes de se contar uma história, é preciso vivê-la primeiro. Tentar saltar este princípio resulta sempre mal: e, não obstante a mestria com Vargas Llosa conduz a sua narrativa, no que diz respeito ao ex-Congo belga, falha redondamente o alvo.
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