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    O PASSO CERTO NO CAMINHO ERRADO: Crise como Oportunidade

    Nelson Lineu - Moçambique



    O homem pode transformar obstáculos em meios para atingir os seus próprios fins.
    Francis Bacon

    Para Abel e Marcos era impressionante como os jornais, rádios, telejornais entre outro meios de comunicação social falavam da crise financeira que se quer mundial em Moçambique; em vez de alarmante a notícia chegava num tom parecido com tudo menos melancólico; como se tratasse de igualdade com os países que estavam verdadeiramente em crise - digo verdadeiramente porque foi lá onde se criou essa situação e nós como pedra vamos para onde nos lançam -, como que finalmente existisse algo íntimo que nos ligasse de verdade com esses países. O pensamento vinha desse modo porque partilhar as dores muitas vezes é mas sincero, verdadeiro e instrumento eficaz para a união.
    Ambos estavam sentados no seu local habitual, de baixo de uma mangueira, onde poliam as suas ideias nos finais de semana, assim como este. Podia-se ouvir a conversa do outro lado do muro, numa barraca. Queriam estar lá mas não podiam, de um lado por não beberem, que era a condition sine qua non. Abel não podia beber por questões de saúde e Marcos porque não podia usar o seu salário que era mais magro que ele para tal. Por outro lado era porque a conversas dos ocupantes das cadeiras da barraca eram mesquinhas, segundo eles, assentavam-se mais em lamentações e reclamações.
    É peremptório referir que eles ficaram amigos por necessidade e só eram no final de semana. Das vezes que frequentaram a barraca eram motivo de zombaria, traziam ideias ou propostas para acabar com aquelas lamentações. “Se nem os governantes e pessoas estudadas não resolviam os problemas, quem eram eles? Tinham que cair na realidade”, ouviam da boca dos legítimos ocupantes da barraca quando não estivesse ocupada com o copo. Para esses a culpa não era do governo, tanto que as coisas eram assim porque tinham que ser, quem seria insensível até ao ponto de ver as coisas como estavam, podendo e não fazer nada, ficando no luxo da sua casa?! A conversa dos dois naquele sábado como apontado a cima era por causa da crise, essa era a posição de Abel: - Não nos sentimos piores porque como os outros países estamos em crise. Como os outros, Abel ficou assustado quando alguém do Governo deu-se o trabalho de dizer que a crise não nos afectaria, mas mais tarde a mesma pessoa fez o não dito pelo feito.Com a desculpa de que só tinha dito aquilo para não nos alarmar. - Quanto a mim é nessa desprotegida protecção que faz com que as crianças em grande não consigam criar os seus próprios mecanismos de defesa – sentenciou, Abel.
    De tanto conversarem, as ideias de um não fugiam muito a do outro, cabiam um acrescentar algo ou tirar dependendo do assunto. Daí que o Marcos rematou: - A nossa crise vê-se que é por causa da diminuição das doações – já que o nosso estado soberano que é não consegue cobrir o seu orçamento - a nossa medida de austeridade não seria deixarmos de ser criança, isto é, crescermos criando os nossos mecanismos de defesa? Crise é um momento de transformação profunda que pode ser para pior ou para melhor, essa é a oportunidade. Pode ser que não tenhamos mais, e não nos queixemos como sempre desta vez por não aparecerem outras crises.
    cE � = s �߸ ��� tyle='margin-bottom:0in;margin-bottom:.0001pt;text-align: justify'>Em casa não parava. E sempre que o marido lhe exigia satisfações, ela prontamente respondia-o.
    ― Não me incomode se não, vou-te denunciar.
    ― Denunciar, fiz o quê?
    Peniscilina dizia que iria ao gabinete de atendimento à mulher vítima de violência doméstica para apresentar a queixa de que o seu marido, quando se envolvera com ela, há dez anos atrás, ela era menor, contando apenas com catorze anos de idade. Houve nessa altura violência sexual, acreditava ela.
    Você abusou-me e violou-me sexualmente ― ameaçava, bêbeda Peniscelina quando lhe apetecia.
    Não foi violência sexual, mas sim agressão sexual ― retrucava Salomau, concluindo no seguido, ― todo sexo é violento. Mesmo o consentido.
    Não paravam as discussões. Ainda, uma vez, Salomau seguiu a esposa numa barraca para que ela viesse à casa e tomasse conta do recado doméstico. E ela respondeu, com violência verbal.
    ― Por que me persegue? Não vês que eu não te quero?!
    ― Se não me quisesses, ias procurar feiticeiro para pôr-me na garrafa?
    E seguiam outros palavreados e palavrões, indescritíveis.

    O PASSO CERTO NO CAMINHO ERRADO: Fala, silêncio e tom


    Nelson Lineu - Moçambique

    Maratona-mo-nos todas as vinte e quatro horas, a meta é alcançar um problema
    uma mão sujando a outra o vencedor é quem detecta
    mais dificuldades em nós; ao atingir a meta
    dissemos é para quem de direito
    que podem ser todos
    menos
    nós.

    E sta maratona descrita por mim é o cenário que vem nos caracterizando em todas esferas do nosso quotidiano. Precisamente aos artistas, aos analistas da praça, aos políticos - incluindo os governantes -, mais parece estarmos a lutar para encontrar problemas do que propriamente resolvê-los ou procurar mecanismos para tal, aceitaria até com palmas se ao menos os novos problemas fossem soluções dos anteriores. Há que definir o que é problema? E para quem é? As indagações deviam servir para abrir caminhos – o contrário do que se tem feito actualmente: servem de pedras, fechando ou tornando o caminho estreito, a maior parte das vezes intransitável com armadilhas que interpretam-nos como imagem no espelho a frágil democracia, enfraquecendo deste modo os nossos instintos de sobrevivência. Mas também como André Maurois penso que sem espírito crítico nenhum homem se pode considerar livre.
    Para esta edição coube-me o desafio resistível, de escrever sobre a AEMO (Associação dos Escritores Moçambicanos). O desencanto é porque quando desembarco nesse barco-escrita a corrente da água deixa-se levar pela admiração, espanto ou indignação. Nesse caso nem uma, nem as duas coisas. Nietzche diz que não devemos ser médicos dos incuráveis. Será que estamos perante esse caso? Será que esse é o motivo do meu pouco entusiasmo?
    Não se trata de optar pela indiferença, pelas minhas posições em certos fóruns em relação a AEMO, o meu silêncio até aqui pode deixar a desejar. Uma vez sobre o silêncio num poema escrevi: “o silêncio também é música, sendo música: mal tocado cria ruído” É caso para dizer que quando se trata da AEMO actualmente, calados ou não o tom é alto - (um adjectivo por caridade). Mas não vou terminar sem partilhar um episódio:
    “Certo dia, numa palestra organizada pelo Movimento Literário Kuphaluxa – uma das actividades do em que um escritor faz uma apresentação com o tema: por que ler? - Um estudante perguntou ao orador que por sinal já foi secretário-geral da AEMO: Com quantos anos pode-se lançar um livro ou tornar-se escritor?” A pergunta a priori parece carecer de sentido. Mas para o estudante tinha e muito, assim como o meu enfado ao tentar escrever sobre o tema proposto. Mas perguntas como essa circulam nas cabeças de muitos moçambicanos.

    O Passo Certo no Caminho Errado: A Saudação

    Nelson Lineu - Moçambique

    Quando Alberto entrou no chapa, uma questão pairava na cabeça dos passageiros: “ de que lado ele estava?”. a questão era por causa da ligadura na testa, pontos na parte exterior do nariz e os lábios inchados; propriamente, se ele pertenceria a turma do assaltantes ou dos assaltados. Com todos os olhos sobre ele, como se advinha-se o que os outros estavam a pensar, tratou de esclarecer, lamentando-se, foi assaltado, eram vinte e três horas, numa rua sem iluminação, sem policiamento; logo que saudou os meliantes, ao dar por si viu-se sem telemóvel, carteira. O estado do rosto era correctivo dos assaltantes por causa dos seus gritos - embora inconscientes - e uma resistência por instinto. A partir desse momento, as pessoas foram dando opiniões acerca das razões que podiam estar por de trás daquele incidente, os que eram a favor apoiavam os argumentos ou acrescentavam, os contras não só refutavam davam as suas posições. Um funcionário público disse que era por causa da crescente desigualdade social. Uma senhora que era revendedeira num dos mercados da cidade disse que o problema era da hora do assalto, e que a desigualdade social era algo que acontecia em todo mundo e nem todos eram assaltantes. Um empregado doméstico concordou com a senhora, mas tinha um outro factor, a falta de iluminação. Contrapôs um segurança duma empresa privada, para ele esse não era o motivo suficiente - até porque certos assaltos também aconteciam de dia -, com isso o problema era dos policias que não andam nas ruas para proteger os cidadãos, algumas vezes eles mesmos participavam nos crimes directo ou indirectamente. Rebateu uma moça que contou, que numa noite, graças a ajuda dos policias escapou de uns homens que queriam violentar-lhe sexualmente, e como agradecimento pele serviço prestado não só a ela mas ao povo no geral teve que se deitar com eles, mesmo na estrada. Os que chegavam no seu destino desciam e outros subiam, o debate continuava, mas as opiniões não fugiam muito do que os outros disseram. Quase a chegarem na paragem, um homem que estava no último banco do lado esquerdo, que até então não tinha falado nada, era como se não ouvisse o que os outros diziam, por isso todos prestavam atenção quando ele falava, seguro de cada palavra que saía da sua boca, os gestos confirmavam, o olhar decepava qualquer duvida. – Todas as posições são plausíveis, a desigualdade social podia estar atrás desses assaltos, a escuridão, a falta de segurança na rua. Pela minha experiência, o que foi decisivo e originou o assalto, foi o facto de o Alberto ter cumprimentado os assaltantes, o que revelou medo por parte dele, tornando-o vulnerável. Essa posição teve aplausos, não se sabe pelo certo, se pelo conteúdo ou pela habilidade na fala. Mas a duvida mas relevante é que todos desceram com uma mesma questão: De que lado o homem estava? Se dos assaltantes ou assaltados.

    O passo certo no caminho errado: Inventando-nos para novos desafios, desafiando-nos para novas invenções


    Nelson Lineu - Moçambique


    Somos feitos de pontes que nos fazem fonte do nosso ser, numa nascente que se desenhou em Berlim passando por cima de culturas, valores e evolução histórica. Em busca duma identidade hoje legitimamo-la não como imposição, mas dando-lhe um outro sentido autóctone; num leito que se quer desequilibrado quando for condição para equilibrarmo-nos; a foz que faz cruzar sonhos, dores numa corrente de amor não apenas por solidariedade mas responsabilidades para o que assumimos em cada passo dado, cientes em cada margem do nosso valor.
    Assumindo que os nossos milhões de braços não nos fazem uma força, deixamo-nos levar por uma que nos faz milhões de braços. Que se explica por vários factores. Não devem ser sempre os Deuses e Deusas a resolverem os nossos problemas, os nossos cânticos, tambores que se façam ouvir, na melodia que o tempo ensinou-nos, testemunhadas pelas cicatrizes.
    A união que faz a força não deve ser apenas nos pontos onde convergimos, na divergência também pode estar o desencontro com o presente que ora negamos ora aceitamos dependendo da posição em que encontramo-nos. Essa posição que muitas vezes vem duma mão externa - esse ponto aqui não é colocado para servir de desculpa como temos feito habitualmente, mas para assumir a culpa onde somos culpados, não por adulação - aceitar determinar-se por essa posição é perder a tão propalada auto-estima, ou seja amor-próprio. O que acontece é que essa posição para muitos é o símbolo da tal auto-estima, que entre nós nota-se mais nos discursos políticos – como agenda politica - ou em figuras publicas que neles nota-se tudo menos ela. Deste modo dá-se uma aula de como amar-se a si próprio, povo e pátria. Se cada povo merece o seu governo como disse o sociólogo, quer dizer que cada governo mercê o seu povo? Sendo assim o povo não seria pior? Em si é motivo suficiente para ficar-se de braços cruzados?
    Diariamente Semeiam-nos um devemos ser à queremos ser, sem nunca passar do somos. Essa ignorância custa-nos entre outras coisas a esperança. Conhecermo-nos traria como consequência conhecer o outro, que seria o prolongamento do nosso ser, ultrapassando os partidos, ideologias, regiões e religiões que até aqui só serviram para separar-nos e retardar a nossa afirmação como nação; que hoje vê-se como necessidade não mero luxo, e com ela uma construção de valores; numa construção e desconstrução de saberes onde somos sujeitos activos e todos prontificados para protege-los, os novos poli-los ou audaz e jovialmente reconstruindo de acordo com seus tempos, sem nunca deixarmos de ser, inventando-nos para novos desafios, desafiando-nos para novas invenções.

    O passo certo no caminho errado: Trezentos e sessenta e tal dias


    Nelson Lineu – Maputo




    Mesmo conhecendo a máxima do Nietzs-che Segundo a qual tínhamos que fazer as coisas com amor de mãe, por elas não quererem recompensa dos filhos; a Deusa da palavra deu-me luz nesse maningue naice espaço do mundo, nas mãos kuphaluxadas que todos dias apanhavam e continuam apanhando lenha para que eu conte estórias, numa fogueira que cruza mares, renascendo em cada cultura num dinâmico e mestiço vocábulo, em sotaques que lhe tornam único e belo, pincelado por um respeito mútuo que se quer reinventado.
    Eu, o areópago onde os criadores acentuam o seu paradigma de libertar conhecendo o seu valor por necessidade não por vaidade, com o testemunho do poeta da Mafalala, a dificuldade da verdadeira poesia não são as ideias mas as palavras. Que nascem das letras, e fazem frases, que por seu turno apresentam-nos textos, que se harmonizam em livros, e os livros vivem de fazer. Acção que levou-me a dar volta aos Trezentos e sessenta e tal dias, quero que cada encontro de palavras seja o ómega, como digo: não existe fim, o que existe é um novo começo.
    O deixares de ser você não é para ser outro, mas para ser mais você mesmo. Essa conexão é a minha alegria, lembrando que as tristezas passam e alegrias são para sempre. Não para serem conservadas mas criadas dando-lhes novos tons, quanto mais cúmplices forem, mais energia transmitirei um ano outro, já que os passos de alguém revelam se já se encontram no seu destino e quem conhece o seu caminho, conhece o seu bom vento, como falou uma vez Zara-tustra na sua caverna.
    Aqui onde o erro é necessário, chegando a dar-se passo certo mesmo no caminho errado. Como quem anda por cima da água, eremita na multidão, múltiplo na solidão, num ser ou não, ora contemporâneo ora extemporâneo, entre tudo e nada, podendo até ser nada desde que em si exista. Não existe fronteira no sentir ou como quero nas palavras, quem tenta impor limita-se a si mesmo.
    A língua, esse fio que nos missanga não deve ser o nosso único elo de liga-ção, podendo rebentar do lado mais fraco e nos dispersar-mos. Ela não existe fora de nós, Nós é que damos-lhe existência, muitas vezes movidas por nos-sos interesses que nem sempre são comuns e nem necessariamente devem ser. Nela devemos encontrar o nosso rosto como se fosse espelho, e esse espelho entre outros nomes pode chamar-se literatura. Quando vamos ao espelho cinemar-nos, bonito ou feio, quem diz não é o espelho somos nós, ele só repete o que o dissemos, só que na sua linguagem.

    O passo certo no caminho errado: Ecos da poligamia


    Nelson Lineu – Maputo



    O sol foi-se deitar, e a lua acordou. Nesse dia Jeremias não prestou a devida atenção, fazia dessa ocasião uma festa porque a mãe disse-lhe que ele nasceu num instante igual. Esse estado despercebido acompanhou-o também no jantar, que era justamente o seu prato predilecto, matapa com arroz branco e peixe frito, que foi ele a escolher quando foi com a mãe no mercado.
    A progenitora fazia questão de sempre brindar o menino quando conseguisse alguma graça. Nesse dia não fugiu a regra por isso como prémio levou o filho para o bazar; na hora do jantar era como se comesse contra o seu gosto e quisesse estar no outro local. A mãe perguntava-se, se a comida não estava como ela tem feito sempre, a duvida se foi ao notar que os outros filhos comiam com o mesmo gestos de sempre e palavras como: - mamã não para de se superar.
    Ela não demorou e descobriu que ele estava assim por causa daquela pergunta, que uma vez ouvira o menino dizer não querer voltar a fazer mais. O que mais a doía era não poder satisfazer-lhe, pelo menos respondendo a pergunta já que a causa não estava nas suas mãos. Ela fez de tudo para isso nunca acontecer na sua vida, dizia-se azarada porque essa não era cultura da sua região do país (norte).
    Depois do jantar os outros foram ver novela e ele saiu para brincar, a mãe não reclamou pela hora, porque sabia que o menino logo voltava, não estava com ânimo para tal. Ele foi a cama como os outros também fizeram, mas naquele momento queria ir ou estar em qualquer sítio menos na cama, resistiu quanto pode, porque o sono foi vencido no jogo com os ponteiros. Acordou, saiu correndo com ramelas ainda nos olhos, pouco vestido e descalço e deitou fora a pergunta:
    - Papá dormiu em casa? – Jeremias só queria mostrar-lhe os vinte valores que teve no teste.

    O passo certo no caminho errado: Os especialistas e analistas


    Nelson Lineu – Maputo



    Enquanto esperava pelo concerto do seu carro na oficina ao lado do seu emprego (era assim como ele tratava o seu trabalho), onde era cliente assíduo assim como na alfaiataria que por causa das lutas no chapa tinha que cozer a camisa ou engomar, João (não o das anedotas) verificava em pensamentos que a televisão, rádio, jornal nos seus informativos em relação aos assuntos que fazem barulho na praça, terem sempre um especialista ou um analista para falar da problemática em questão.
    Para ele não havia o que discutir, os órgãos dessas comunicações sociais é que escolhiam os temas, porque não era possível não se dar especial enfoque para falar relação Salvancos transporte. Da sua casa para o emprego tinha que contar quilómetros, os chapas que optavam por ir a sua zona estavam danificados (o adjectivo mais bonito que encontrei), mas mesmo assim eram preciosos por causa da quantidade de carro e das pessoas que necessitavam os serviços.
    Querendo evitar esses transtornos teria que se mudar para a cidade ou mais próximo, mas aí quer as casas quer os talhões eram proibitivos para gente com o seu salário. Boa ou má escolha optou por fazer um empréstimo e comprar um carro pelo qual passaram dezenas de traseiros, o mesmo que ele a guardava enquanto reflectia. Se fosse para chamar um especialista que comentasse sobre essa realidade teria que ser ele, desanimou-se porque quem aparece quase sempre nessas ocasiões são membros de um partido sendo cidadão simples tinha que ser doutor, de preferência os formado fora do país.
    Quanto ao João ser analista, como sempre entre nós os que falam dos assuntos quer com olhar sociológico, antropológicos ou outras janelas epistemológicas, a sua opinião estaria intrinsecamente ligada a questões políticas. E por aqui não se discutem aspectos apenas do país mas também de fora, o que muitas vezes chama atenção é facto dos protagonistas falarem dos outros como se fossem eles, ou seja, saberem muito dos outros do que deles. É nesse campo onde o João quer meter o dedo na ferida ou como sempre ser a ferida, para ele não havia dúvida que quem trazia a democracia em África eram rebeldes, como aconteceu recentemente na Líbia.
    Uma coisa que lhe deixou estupefacto é que o regime de Khadafi sendo o que se tem dito pele imprensa como é que aquele número de líbios tinha acesso a arma, e por quê das forças ditas da paz apoiarem os rebeldes não a soberania de um estado (a não ser que essa palavra para eles tenha outro significado). Para ele tinha uma mão externa, claro que vão dizer que se os outros fizeram isso acontecer tinham também um factor interno e o mesmo aconteceu com os nossos cá em Moçambique que se chamam pais da democracia. 

    O passo certo no caminho errado: O Dilema das cores


    Nelson Lineu – Maputo



    O convite veio a uma semana, na mesma duração o Lourenço pôs-se a pensar no traje, não no seu, mas o da sua companheira. Conheceram-se quando ele fazia a escola comercial, ela trabalhava na secretaria da escola. Ela vendo-lhe muitas vezes no seu canto, chamava-lhe para conversarem, e lhe dava dinheiro para lanche, já que ele nem para apanhar chapa tinha, percorria vários quilómetros até chegar na escola, cansado e muitas vezes faminto, era de uma família pobre e vivia nos arredores da cidade.
    Fernanda era motivo de risadas dos alunos por causa da não combinação das cores da sua roupa, motivo esse que ela soube depois. Lourenço era o único que não procedia assim, pelo contrário elogiava-lhe
    Feito o ensino básico na Escola Comercial, enquanto ele procurava emprego decidiu concorrer para o instituto comercial, onde faria o nível médio, foi admitido brilhantemente. Menino como chamava a funcionária da escola era o canto onde ela ouvia a sua voz, com a possibilidade de não se verem mais, decidiu unir o urgente e o importante. Lourenço passou a viver em casa dela, tendo melhorado algumas das suas más condições, ainda por cima era perto do Instituto escola. Ela vivia sozinha, nunca permitiu homem entrar na sua vida, temia que acontecesse o mesmo que aconteceu com a mãe, depois de ela nascer, primeiro o pai não assumiu, quando finalmente assume, disse-lhe que viajaria em busca de emprego e o melhor para a filha. A mãe morreu esperando porque ele fez com que ela prometesse não se envolver com alguém até ele voltar.
    Enquanto ele fazia o curso, a troca de carinho, afecto e amor de mãe e filho, passou para de homem e mulher, quando ambos perceberam procuram fugir, era nessa fuga onde mais crescia a vontade e desejo de estarem perto um do outro. Numa noite como ambos dizem, sonambulamente viram-se sobre a mesma cama, ambos afirmam não saber de quem era a cama porque naquele momento, era eles e o mundo ou seja partilhavam-no.
    Lourenço fez o curso em tempo recorde que lhe trouxe compensação um emprego na empresa onde fez o estágio, funcionário exemplar e inteligente, foi subindo de posto em posto, ganhou confiança do chefe até ao ponto de contarem-lhe como é que o dinheiro entrava na empresa, que eles trabalhavam era só para inglês ver, a empresa tinha outros negócios e a embalagem eram contentores.
    Hoje tem o seu primeiro encontro onde vai ser apresentado aos outros da cúpula, quanto ao traje para ele não há muita dor de cabeça é só um simples fato, e a esposa? Voltava-lhe na cabeça a questão de ela não saber combinar as cores, embora ela já tinha ultrapassado esse obstáculo porque ele soube dizer-lhe. O que fez com que ela percebesse que ele gostava dela de verdade e não seria como o pai. Agora a coisa era diferente, ele questionava-se se a mulher saberia combinar as cores da corrupção. 

    O passo certo no caminho errado: Os nomes e os feitos


    Nelson Lineu – Maputo


    O que nos identifica são os nomes ou os feitos? Vemos nas placas de identificação das ruas, avenidas, praças entre outros empreendimentos nomes e os feitos. Não obstante o nome estar mais visível pelo destaque a que nesses casos é dado.
    O nome possui significado pela convenção, em nenhuma parte dele tem significado se considerado separadamente de todo, como escreveu Aristóteles. Esse significado, quando a pessoa, já perecida acaba existindo também convencionalmente chamamos de obra. Após a morte, falam mais dos nomes ou feitos? O que acontece é que temos que fazer algo em vida notório para sermos lembrados, infelizmente nem sempre tem sido coisas boas. É só falar
    “Só sei que nada sei” para sabermos que estamos a falar do Sócrates e, basta vir-nos a mente a terrível imagem do 11 do Setembro para nos lembrarmos do Bin Laden. Essa Obra (feito) na sua lista também entram os filhos, descendentes a eternizar. Outro factor não menos importante a tirar dos escombros são as mães que seguindo o critério passam na maior parte dos casos despercebidas, já que com acordos sócias os apelidos são masculinos, pessoalmente duvido se estava uma mulher na hora do acordo se estava é porque o machismo já estava implantado á muito.
    “ E tudo o quanto pedirdes em meu nome eu farei, para o pai seja glorificado no filho” João 14:13-14.
    Falando do nome também já estamos falando dos factos. O que os parentes dão continuidade o nome ou os feitos? Sem querer falar dos artistas que as suas obras muitas vezes têm a ver com o dom, mas podem muito bem dar continuidade divulgando a obra e o nome. O que os liga são os nomes ou feitos? Sendo o nome ou feito uma causa “ não basta que seja pura e justa a nossa causa é preciso que a pureza e a justiça exista em nós” como em versos escreveu Jorge Rebelo.
    Creio que antes da escrita os seres humanos já se faziam valer da imagem e dos sons para denominar as coisas e seres. Nascemos sem nome e encontramos um cá na terra que nos fazem abraçar sem a possibilidade de escolha, mas os feitos (actos), independentemente de ser ou não nossa vontade respondemos por nós seja qual for a consequência.

    O passo certo no caminho errado: A oralidade na escrita


    Nelson Lineu – Maputo


    Veio mesmo a calhar a visita da avó Margarida, Eugénio estava empolgado para dar a notícia segundo a qual era o motivo do seu sorriso nos últimos dias, mal entrasse de férias arrumava a mochila e bazava para a localidade onde vivia a avó e nasceram os seus pais, visto que mais tarde migraram para o local onde hoje inventam vidas, para ele era isso e não se discutia mais, tinha como justificação o facto da criatividade africana. Acontecera nas últimas semanas, viu no noticiário a edição de um livro de estórias, as mesmas que ouvia na fogueira da sua avó e deixava-se embalar ou seja futurar nela, o seu maior medo é que elas morressem com o tempo, vendo a sua camada marimbando para elas ou quem de direito, seguir o mesmo itinerário.
    Com edição desses livros tinha com que se orgulhar, não nos perderíamos num enredo que vem sendo traçado há séculos. Contando a avó sobre a boa nova, respondeu com as seguintes palavras:
    - Meu neto, eu também gostaria de estar a sorrir como você, fazendo isso parece-me que estaria a rir-me de mim mesmo. Olha que fiquem bem claro, não me oponho a isso, ainda me chamam de ultrapassada como vocês adoram fazer. Com a edição dessas estórias que não aparecem como iniciativas nossas, como sempre, perderemos o que mais significativo para nós tem nelas. Ora vejamos, elas acompanham-nos há séculos, cada um vai contando a sua maneira adequando-se ao seu tempo e desafios. Com a escrita elas estariam estáticas, contaremos apenas o que estiver lá escrito, estaremos presos as letras e as significações de quem conta. Se queremos preservar essas estórias, não era melhor cada um dar-se a missão de contar passando de geração em geração como temos feito até agora? Mas é esse nosso dilema africano diário conviver com esses dois mundos, mas escolha meu neto, não tem que ser sempre feita a partir de conveniências.

    O passo certo no caminho errado: Finalmente, a resposta da produtividade


    Nelson Lineu – Maputo


    Eu já estou farta dessas incriminações e acusações mais levianas que vocês, a boca pequena vem falando de mim, inventando nomes e episódios, capacidade para isso nunca vos faltou. Com um tom elevado a vossa voz fez-se mal sentir no memorável cinco de Fevereiro, nos um e dois de Setembro, naquelas manifestações populares aquando da subida do preço dos combustíveis consequentemente o transporte e os produtos da primeira necessidade, houve mortos, destruições de bens de inocentes. Quando os pseudocavalheiros vieram ao público primeiro disseram que as manifestações foram por causa das mensagens enviadas pelo telefone, desculpa de criança que faltou na escola por causa da chuva. Sendo verdade e reconhecendo a eloquência tínhamos que implorar pelos serviços de quem as enviou para chamar pessoas as urnas. Em segundo lugar disseram que vivia-se aquela miséria por causa da produtividade, logo eu que mal conheço-vos, passo na vossa frente esperando um aceno vosso mais nem um sinal, apenas limitam-se a apreciar o meu traseiro, nesses quarenta graus esfriam-se com o meu andar. E se não fossem as consequências das manifestações, quando é que iriam aparecer ao público reconhecer a vossa não virilidade? Reconhecer como quem diz, porque vocês como sempre atiram culpas para os outros não fugiram a regra, agora eu é que sou a culpada, põe-me sobre a responsabilidade da vossa fraqueza da mudança, se a vitória prepara-se e organiza-se como vocês dizem é assim que estão preparados e organizados para vencer? Não a mim, mas aos vossos fantasmas.
    De principio achei que eu seria tinta de mais para a vossa caneta, tentei aproximar de vocês, mandar recados, olhares, parece que mais distanciou-me de vos. Limitam-se apenas a ouvirem histórias dos que já possuíram-me e vão-se deleitando terminando em masturbações, Sonhos, desejos, planos. Até quando? O mais chato para mim é quando gabam-se, tendo-se como os mais maduros, como o exemplo para os outros seguirem, o mais grave ainda é o facto desses outros consentirem.
    Eu não posso chegar para vocês e simplesmente entregar-me, além de não estar tão carente assim como vocês eu também tenho meu orgulho feminino, no vosso caso admito ser tradicional, não como as que se dizem modernas indo atrás dos homens. Pelo vosso perfil percebi que não me darão valor mais tarde. Por caridade digo: o vosso problema não sou eu, produtividade mas sim a improdutividade (a casa dos fantasmas), como vocês próprios apontam no vosso discurso sobre a pobreza absoluta ela também está no mesmo lugar, vossa cabeça.

    O passo certo no caminho errado: A avermelhação do verde


    Nelson Lineu – Maputo



    Custódio Sábado estava sentado na sua casa, quando viu Tiago passar com um ar desinteressado, nem se quer saudou. Ficou admirado, nunca tinha acontecido. Foi uma táctica que o rapaz usou. Todos sábados, Custódio contava-lhe como foi a sexta-feira, como ele chamava. Antes de contar enrolava, criando ansiedade e curiosidade, quando Tiago fazia-se passar por desinteressado, Sábado contava como foi a noite que sempre era criança.
    Custódio esperou o Puto, preocupado, logo que o viu, chamou-lhe, de seguida foi contando. No seu cenário habitual, matando a babalaza, comendo numa panela suja que ele dizia lavar quando estivesse mal disposto. A panela de barro continha restos de comida do dia anterior, ele cozinhava por cima dela, via aquilo cimo uma relação sexual, o prazer era notório quando ele comia, mesmo com toda porquice (não lavava mão nem cara) dava inveja quem o via transportar comida da panela a boca. Ainda por cima era guloso, só servia quando eliminasse sua fome e restasse algo, o interlocutor morto de curiosidade como um gato na sua sexta vida, dispensava a inveja.
    - Quando eu voltava do trabalho, vi de longe alguém com um estilo igual ao do meu amigo, aquele da zona verde, o que se fosse a uma barraca ou bar ia a procura da mulher, o que não era da zona verde por viver naquele bairro com esse nome, mas de espírito e coração. Foi aproximando-se, a imagem tornando-se nítida, aquele homem de chapéu e camisa vermelha era mesmo Gonçalves, mesmo com essa certeza eu ainda duvidava. Ele sofria de sportinguismo, dizia ter sangue verde, a derrota deles pelo Benfica, não lhe transformaria assim. Não podia ser possível, podia acontecer qualquer coisa no mundo, essa realidade não se passaria na minha cabeça. Depois de cumprimentarmo-nos, não haviam duvidas, era ele o avermelhado, havia uma força na sua mudança. Fomos ao bar vizinho, entre copos surge mais um insólito, disse antes de tudo tinha que lhe chamar por camarada (prefixo de qualquer membro do partido frelimo), foi como se o álcool estivesse a sair de mim, elucidei-me. Continuei a entornar, Logo Gonçalves que jurou nunca votar nesse partido por causa da morte da mãe na guerra que ficou conhecida como a de irmãos ou civil e o pai que sofreu muito com o regime que para ele era ditatorial, a sua maior dor era a adulação que se faz nos nossos dias para o líder, consolava-se porque entre nós quando se morre passamos de pecadores para santos. Essas inacreditíces, é que faziam-me esquecer meu nome como naquela minha maior fará, aquela que acordei num convento, nu, com todo material a doer. Gonça, carinhosamente tratado, tornou-se revolucionário queria mudar o regime, foi mudando de partidos da oposição para atingi-lo, alimentando a sua esperança. O maior obstáculo para ele foi um outro sonho. Com a possibilidade de nenhum deles concretizar-se, tornar-se evidente, apostou no outro, o qual não podia morrer sem concretizar. O verde dele avermelhou-se, por causa do seu de tornar-se Secretário do bairro, porque nesse país só concretiza sonho

    O passo certo no caminho errado: O eu tenho um sonho do Martins


    Nelson Lineu – Maputo


    Martins, o Escravo é assim que ficou conhecido depois de lido seu testamento. Começou a estudar com doze anos. A professora que estava no dia da leitura, dizia que ele estudava para poder sonhar, confirmavam os amigos e colegas que foi tendo durante a vida. Terminado a sua licenciatura, depois de vários obstáculos desde a falta de dinheiro que lhe obrigava a trabalhar em condições desumanas, falta de tempo para fazer os seus deveres de estudante por causa dos mesmos trabalhos, descriminação por causa da sua condição social que não fazia com que as aparências enganassem.
    Morreu num acidente, quando estava a caminho do local da sua graduação. E na dependência em que vivia, num dos compartimentos do guarda-fato, encontraram um papel que se teve como testamento:
    Eu tenho um sonho, o meu sonho é que essa palavra esteja plasmada na carta dos direitos humanos, precisamente na nossa constituição da República, inclusive nos meandros religiosos. O Eu tenho um sonho sendo respeitado como dever e direito.
    Por esses dias o Eu tenho um sonho, acaba sendo substituído por Eu tenho um interesse, onde o lutar para atingi-lo, quase sempre destrona os princípios humanos, tornando este moral.
    Para agirmos moralmente bem, temos que agir livremente, e ter em conta que esta liberdade tem que ter limites, para não cair na libertinagem, dai a necessidade do estabelecer de normas numa sociedade.
    Os países africanos, incluindo o nosso, alcançaram a independência, guiados consciente ou inconscientes pela frase Eu tenho um sonho, alcançada a independência, a luta dos governantes era fazer do Eu tenho um sonho comum os dele, ele sendo a pessoa certa para concretizar, inibindo os outros que tenham os mesmos sonhos ou outros Eu tenho um sonho. A luta acabava sendo dos sonhos aparentes, porque transforma-mos em interesses. Apadrinhado pelo princípio diplomata, entre os países não existe amizade, mas sim interesses.
    Eu tenho um sonho, em que assim como a liberdade, todos sonhemos, e não passando por cima dos sonhos dos outros. A pobreza que nos acompanha, chegando muitas vezes a identificar-nos, em mim aparece intrinsecamente ligada a qualidade e quantidade dos nossos Eu tenho um sonho. Encontro nisso o fundamento dos nossos dias, ou fundamentada a questão. Vivemos do Eu tenho um sonho, nesse caso os países que chama-mos por doadores e do que vemos na televisão, participando no mundo sonho como pacíficos, mão-de-obra, o mesmo que aconteceu naquilo que a história chamou por colonização.
    A escritora moçambicana Paulina Chiziane no livro As Andorinhas, disse que para sermos reis na vida era preciso primeiro sermos nos sonhos, é precisamente do Eu tenho um sonho, que precisamos, antes de slogans que não servem para encher a nossa pança muito menos a cabeça de imaginação. O filósofo americano Richard Rorty, citado pelo moçambicano Elísio Macamo no livro planícies sem fim, diz-se que o mundo não estava errado, o que estava errado era maneira com que olhávamos o mundo. Assim também acontece com o nosso Eu tenho um sonho.
    Como Kant no iluminismo, eu digo ouse sonhar.

    O passo certo no caminho errado: Penduras no dia dos trabalhadores?


    Nelson Lineu – Maputo



    Passaram-se dois anos depois da burocracia que vai nos caracterizando, hoje 1 de Maio, pela primeira Gomes tem a oportunidade de desfilar como os outros, vestido de inquietações caprichando na sua indumentária (necessidades), tem consciência que a sua empresa tem mais número de pessoas nessa marcha. Sente-se orgulhoso por ser ele a dar essa dignidade a ele e ainda mais aos outros.
    No igual número de anos atrás, estava ele vendo os outros a fazerem a manifestação, dum lado triste por não poder entregar curriculum vitae numa empresa por ser feriado, e do outro embora com muitos motivos para se manifestar, fazer-se ouvir, por coisas que segundo ele não o beneficiariam apenas, não o podia fazer, porque todos manifestantes eram empregados. Ele nem esse direito tinha, era preciso subir alguns degraus para ter necessidades como a dos outros, as que tem direito de ser ouvidas.
    Ficou assistindo toda a cerimonia, lendo cada rosto, inclusive a dos governantes, em muitos casos parecia que entre eles e marchantes vivia-se momentos diferentes, assim como os locais.
    Naquele 1 de Maio foi o último a sair, muito cansado, mas com vontade de trabalhar não só com o corpo também com o pensamento, porque segun-do ele poucos faziam isso, remetendo essa função a barriga.
    Chegado a casa um abraço na mulher, beijo na filha, e um olhar no espe-lho para ver se era ele mesmo, pós nesses dias duvidava de tudo, vivia de Zé-fastudice, o número de anos da sua formação era o mesmo que anda-va desempregado até surgir a sua ideia magnífica, associação. Via todos os dias surgirem independentemente da pertinência do motivo, foi percebendo como elas funcionavam, assim como as legalizar. Era peremptório sublinhar que não tinha fins lucrativos, para ele se calhar o nosso estado era assim também, o resultado via-se nos nossos os dias.
    Foi conversando com algumas pessoas da sua situação, falando da sua ideia, que começara com os do seu maxaquenado bairro, a nível do distrito, município, depois de tantas lutas, conseguiram legaliza-la graças ao apoio de empresas de cidadãos que saem dos seus países só para nos ajudarem, sabemos que algumas dessas nações vivem a mesma situação que nós. São tão generosos que não vem os seus compatriotas, é isso mesmo Moçambique é um país especial, sem dizer maningue nice.
    Nessa era que os discursos nos dizem ser de empreendedorismo, o deles chamou-se: associação dos desempregados de Moçambique.
    Claro, ele foi eleito o presidente, quando uma empresa quisesse recrutar algum pessoal, eles é quem intermediavam, tratavam de receber currículos e escolher os adequados consoante as vagas.
    Era verdade que nem todos se beneficiavam, mas como sempre ouviu nos discursos calmava-os dizendo: é um processo. Assim hoje pelas cidades todas do país eles estão a manifestar-se, uns formalmente outros nem por isso. O importante é que já tem direito por serem membros dessa associação, que também como noutras áreas não é para qualquer um, é preciso seguir alguns requisitos, alegam que é assim para ter mais credibilidade.

    O passo certo no caminho errado: A Farra do livro


    Nelson Lineu – Maputo



    Decorreu do dia 20 á 22 deste mês a III feira do livro de Maputo, no FEIMA (feira de artesanato, flor e gas-tronomia de Maputo), mesmo ao lado do parque dos continuadores. Essa palavra “continuadores” fui ou-vindo em música nos meus primeiros nos de vida, em mim sempre entoou alto o trecho que os músicos, nesse caso jovens, diziam que eram continuadores da revolução moçambicana. Hoje eu dando primeiros passos na escrita, a palavra veio mesmo a calhar.
    Mia couto, cronicando perguntou se hoje tínhamos continuadores, de quê, num sentido mais amplo, política e sociedade. Na literatura essa questão tam-bém aparece com o mesmo pesar. Com essa quase marginalização da literatura, é fácil justificar, quando quem está em frente das livrarias, editoras e órgãos decisórios do governo são pessoas que não estavam directamente envolvidas com ela. Cai por baixo quando os intervenientes afastavam-se dessas for-malidades, o balde de água fria vem ao notar-se que hoje temos protagonistas dentro e a coisa mantém ou piora.
    Tivemos uma feira de livro pouco divulgado quer den-tro da cidade, país e muito menos fora. Eu passo a observação se a organizador não o fez porque a feira não tinha atractivos. Estando num país ou cidade em que o público literário acaba sendo o mesmo, na mesma semana ou dia em que ocorreu a feira da ci-dade houve outra, só que numa livraria, teve a inau-guração do primeiro-ministro e a da cidade do presi-dente do município. Essa feira seria um momento de interacção entre o escritores, leitores e livros, claro não só nacionais, e se nacionais não só de Maputo. o triângulo que tivemos foi do vendedor, mercadoria( livro em promoção) e cliente.
    O que a mim intriga é ter esses eventos patrocinados pelos países que financiam o estado, com eles atrás dessa mediocridade e a verem acontecer, qual é o pa-pel deles quando não vem a acontecer as coisas, quais são os seus interesses? Outra situação é que os doadores (assim como chamamos), estando a fi-nanciar o estado, governo ou partido porque para nós fazem-nos crer que não existe diferença, nesse apar-ente desleixo não acontece o mesmo com as nossas vidas? Essas reflexões fazia, após o final da feira com amigos onde provamos uns copos, as 23 horas trans-portado por uma chapa, cheguei no bairro. Antes de pisar a rua da casa encontrei três jovens, cumprimen-tei e eles responderam-me com o apertar do pescoço, tiram-me os sapatos, carteira telemóvel (segurança é o sector que é mais drenado dinheiro no orçamento de estado), abriram a pasta que continha livros e me devolveram com todos juntos, acredito que se eles estivessem um na mão ofereciam-me.

    O passo certo no caminho errado: O sonho imaginário



    Nelson Lineu – Maputo


    O som sai da sua boca, faz dela um instrumento musi-cal, som de apaziguar almas, resgatar para a mente as coisas boas da vida, as veias dançam, a poesia faz-se e mais leves ficam os que escutam, para tal a condição era ser cliente da sapataria de Fernando Sola.
    Quem espalhava música para aquelas diferentes qua-tro paredes é o Ernesto, elas são diferentes, caniço, madeira, cimento e a outra está maticada com areia. Cada pessoa sentava ao lado da parede consoante a sua posição na sociedade, assim seriam confiáveis nos seus segredos já que elas o guardam. O tecto era feito do céu, um material que segundo ele era fabricado por Deus, a chuva e sol não penetravam naquele espaço, a varanda também tinha direito de ter sombra como as outras, em tempos de chuva ou muito sol a quem abri-gava-se lá.
    O músico nascerá deformado com cada parte do corpo diferente da outra, apenas os olhos eram iguais, uns dizia que era por isso que eram cegos, ele não era cego os seus olhos é que era. Depois da morte dos pais aos seus catorze anos, nenhum dos seus quis abriga-lo, um deles levou-lhe para viajar e lhe deixaram numa das ruas desse destino, onde a agonia, solidão, desafecto, trouxe-lhe esse dom. Familiarizado com a sua casa, até nem sentia falta da visão para se loco-mover para os diferentes compartimentos da casa, o mesmo acontecia com o quintal e bairro, assim como as pessoas que lhe rodeavam.
    Num mundo novo teve que reapurar os seus sentidos para viver, até que foi parar na sapataria, onde passou a noite, já que não tinha portas, porque o sapateiro dizia que se tivesse que ter porta tinha que ser compe-tente para todas as paredes, se fosse por exemplo de madeira como aconteceu roubaram, e foi trocando até que parou de ter roubos quando pós capulana.
    Quando Fernando Sola chega encontra o cego musi-cando. Era um momento em que a clientela se afasta-va da Solaria. Ele vinha como quem vai à uma guerra sem armas nem defesa, escutar aquele musical armou-lhe, entrou como quem entra num sitio pela primeira vez, assustado não estava, a questão dele era se não estava sonhar sentir-se como estava a sentir-se só podia ser num sonho, ele e a vida nunca tinham sido tão cúmplices um com outro numa coisa como naquele instante, soube eternizar em si mais do que uma foto-grafia. Sobressalta-se do sonho imaginário quando o Ernesto da conta dele para de musicar. Regressado ao mundo procura confirmar se aquele som que lhe punha em contacto com a natureza, pede para o miúdo reto-mar, só parou depois de três horas de música, pois esperava que o sola mandasse parar, só fez com a chegada do primeiro cliente, foi nesse momento que se apresentaram, não era preciso dizer nada, o sola ouviu toda história da vida do miúdo na música, embora não com o mesmo tom de tristeza que se davam os factos.

    O passo certo no caminho errado: A vontade das vontades


    Nelson Lineu – Maputo



    Sai de chinelos, calção e camisa modesta, veste-se assim nesses ultimamentes. Vai comprar pão, a mulher foi trabalhar e os filhos foram a escola, colimar o futuro. Horas depois ele mesmo irá ao mercado, fazer compras para o almoço, ouvir papo de lá passou a ser o seu hobby favorito. Hoje em vez da padaria, foi comprar nas senhoras que vendem pães em pleno passeio. É ilegal? E a miséria que lhes é desti-nada?
    A senhora assustou-se por ver aquela figuríssima ali, estava habituado a ver-lhe de carro, ver como quem diz, nem sempre o via porque o carro tinha vidros fumados. O Gusmão Cossa era filho do meio, chamava-se assim por ter nascido, dum pai do norte e mãe do sul do país. Relaciona-mento que segundo o que ele ouvia beneficiava as mulheres porque homens do norte eram dzamwamwas ou matrecos, por confiar cegamente deixavam os salários com as esposas, muitas vezes elas é quem tinham a última palavra. Pensavam assim os do norte, os meninos vão crescendo com a lição segundo a qual não deviam casar com as mulheres do sul. Em contra partida comentava-se que as do norte eram feiticeiras, punham na garrafa os maridos ou mesmo entre as pernas com os seus golpes de sedu-ção, ao chegarem a idade donzela, tinham umas as aulas que chamam por ritos de iniciação, onde ensinam como sem vergonhar. Pelos do sul. O que nesses casos tinham de comum, dum lado era o facto de purificar e angeli-car as mulheres locais, se calhar seja por isso que esse conflito exista até agora, adivinhando a dificuldade de levar um anjo a cama; e do outro os familiares acharem sempre que os homens eram as vítimas e as mulheres doutra zona culpadas.
    O Gusmão Cossa que pelo domínio que se diz as mulheres terem pelo homem teve como apelido o nome do avô do lado materno, o que em si também feria a sua virilidade. O pai quis assim porque o seu sogro foi mais pai dele, que o bio-lógico. Quem está para essas justificações? Gusmão era endinheirado, tinha mui-tas posses, trabalhava nas alfândegas, meteu-se numa encrenca e teve que pagar com a sua liberdade tudo o que tinha ganho na sua opaca carreira e o seu empre-go, excepto a casa e um carro que existe só porque ainda não tinha conseguido um cliente ideal, mas pelo afecto que ele tinha com o automóvel.
    A quando do seu despedimento raramente saia, acabaram-se as festas, os jantares de gala, o fato italiano. Como alguém que estava fora de si não conse-guia perceber, o porquê dele dar como gorjetas aos garções o salário mínimo. Tudo isso observava num dia quando olhava na instante onde garrafas de whisky e vinho da idade dos seus bisavôs desfilavam; Sentia-se na obrigação de ter cachimbo, mesmo sabendo que depois de consumir tossiria durante a semana toda. Do outro lado da instante viu os livros como se estivessem saindo da gráfi-ca, só os tocou quando estava a arrumar. Com uma curiosidade infantil foi desfo-lhando e pensando na possibilidade daqueles papeis se transformarem em dinhei-ro. Comprou-os porque quando conversa-se com alguns estrangeiros, queriam saber sobre livros, as vezes tinha que os convidar para casa, mostrava-os a prova da sua elegância segundo ele, com isso ganhava aos seus colegas na disputa de clientes, sempre soube escapar quando quisessem saber de alguns detalhes do escritor ou do livro, apenas limitava-se a dizer onde moravam, o que fazia além da escrita e arranjava uma desculpa para trocar de assunto. Nesse dia pôs-se a ler, foi-se encantando pelos livros, descobrindo mundos e horizontes, fazia -o bem o facto de se conhecer através deles. Percebeu a razão e a origem dos seus preconceitos e qual era o fim. Sentia-se animado por ter que ser ele a dar o destino. Desabafava com a senhora, incompreendendo o porquê da marginalização da leitura. Pela sua experiência, havia um total desco-nhecimento entre nós, a literatura poderia ser essa ponte, não só para col-matar esse vazio como também a vaga que todos os dias mediocridade e mesquinhice vão conjugando o nosso verbo viver.
    - Como tudo depende de algo- respondeu a senhora- e acrescenta: para esse cenário mudar é preciso que haja vontade, mas não é uma vontade qualquer. Tem que ser a vontade política.

    O passo certo no caminho errado: A careca e a barriga


    Nelson Lineu – Maputo



    Habitualmente prende-se pessoas são para prote-ger a sociedade, e o Fernando Paulo encontra-se naquele local para se proteger daquela socieda-de. Também não era para menos, tanta gente a fazer baru-lho na sua casa, panfletos pendurados, assobios, insultos, a população queria acabar a pobreza com as suas próprias mãos, o que não devia ser, como o fazer justiça tinha pes-soas capacitadas para tal assim também devia ser com a pobreza, era isso que defendia o chefe da polícia quando conversava com a população enfurecida.
    Fernando Paulo que chegara no bairro há um mês, com a sua chegada a população local sentia que o nada que justi-ficava a existência deles tinha dias contados.
    Fazia-se transportar por um Mercedes que multiplicando o salário da população daquela zona durante um ano não compraria, por isso comentário como esses: - a nossa histó-ria começará a ser escrita por uma outra cor.
    Os dias foram passando a mesmice continuava, as dificul-dades nadavam a mesma velocidade, as necessidades e as faltas brigavam para mais um espaço. As pessoas continua-vam a fazer barulho só que desta vez no posto policial. O homem da lei, pediu silêncio para resolver o problema depois de ouvir ambas partes, cada por sua vez, e foi sen-tenciando já com todos juntos, dizendo que o novo vizinho era um motorista, o casaco e gravata que usava sempre era como ele devia apresentar-se no trabalho, a careca era natural, o mesmo acontecia com a barriga, aquele senhor não tem nada a ver com aqueles eles.
    Pelos nossos políticos que é quase impossível distinguir com empresários, apresentarem-se com casaco e gravata não obstante a elevada temperatura que se faz nesse canto do mundo, terem carecas e barrigas grande, as pessoas quando viram o Paulo naquela zona em que pessoas com os seus aspectos físicos e aparências só passavam de cinco em cinco anos, os populares pensaram que as promessas teriam saltado das gavetas. 

    O passo certo no caminho errado: O bicho bicha


    Nelson Lineu – Maputo


    Desta vez a Palmira é décima sétima na bicha, e acontece o contrário das outras bichas por ela frequentada quase que assiduamente, nesta não está por necessidade como ela diz para si é por desnecessidade. Espera pela vez de ser ouvida pela autoridade. Vai vendo uma e outra pessoa entrando, as que saem pelas aparência notasse que são pessoas de posses, o seu semblante continua invariável, como as outras vezes não fez carretas, nem des-peja palavrões, convive com aquele calvário como em casa com mosquito. Entre nós, não existem serviços que se abdiquem das bichas, funciona como sinal de procura, prosperidade, o que mais a incomoda é facto dos prestadores desses serviços não darem sinal de melhoria das condições, o bem-estar dos clientes está em último na bicha deles.
    A Palmira sabendo que os idosos, as mulheres grávidas não se fazem as bichas, pela prioridade assim convencionada, não via a hora de engravidar e ter os seus nove meses de acesso livre. Já que para além de pagar os produtos tinha que pagar o acesso, ficando na bicha. Ela vivia maritalmente com o Palmar, de princípio dizia que ainda queria viver a sua juventude por isso como as campanhas de luta contra o sida dizia ser só para mais tarde, por causa das bichas mudou de ideia logo, inverteram-se os papéis, hoje é o palmar que é posto con-tra parede para ela engravidar, pela demora ela passou a chamar-lhe por incompetente. Pediu para o esposo ir ao curandeiro, ambos eram religiosos ferrenhos, mas ele não seria capaz de cometer esse pecado, se fosse por forças sobrenaturais só tinha que ser Deus, passou a rezar mais do que pensar, ela foi à uma curandeira para se sentir mais a vontade por causa do sexo, mas para dar certo tinha que ter anuên-cia do marido, daí que resultou num fracasso, viviam esse impasse enquanto ela continuava a sofrer nas bichas.
    Até que tomou uma atitude, a mesma que lhe faz ficar nessa bicha de hoje, pegou num pano foi cozendo e pegou em esponjas e pós até que o Palmar indaga: - estas a fazer uma almofada. - Estou a fazer grávida - respondeu ela. O palmar não tinha como discutir com ela, aliás ela não deixaria, ele próprio fazia das dores da mulher nas bichas a sua, ele até podia aceitar aquilo menos ir ao curandeiro, não podia desobedecer ao Padre. Ela vestiu a bata que já tinha comprado à muito e dirigiu-se a bicha consoante a sua necessidade, mas teve que andar alguns quilómetros do seu bairro para não merecer suspei-tas, qualquer sacrifício para evitar as bichas eram bem-vindos. Embora dela fosse falsa, percebia porquê as mulheres grávidas sen-tiam-se donas do mundo, eram centros de atenção. Já no combate só faltava tapete vermelho para pisar ao entrar naquela porta que ela acabou de decifrar o enigma. Os dias foram passando, embora ela tivesse que caminhar um pouco mais do que o habitual para comprar a vida como ela mesmo dizia, o tempo para alcançar os seus objecti-vos era curto e é que contava mais, porque ele é que o dinheiro. Hoje foi numa em que a situação fazia com que todos se tratassem da mes-ma maneira, a desordem impunha-se, viu ambulância a levar um velho, quando ela mesma subia o carro da policia com uma pulseira mais pesada do que a que ela usava nos seus passeios, essa não tinha nada a ver com vaidade, descobriram a sua farsa, no meio da confu-são e tensão, entre empurros e apuros a almofada ou seja a grávida caiu, a policia estava lá para repor a ordem inclusive repôs a barriga dela. E agora esta mais uma vez numa bicha a espera de ser ouvida pelo policia. E vai jogando a culpa ao marido. – Se aquele palmar desse coco – lamentava.

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