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    Africanidades: A arte de saber (d)escrever África pela pena de um Ocidental


    Victor Eustáquio - Portugal



    Parece incontornável o facto de que, para um autor ocidental, escrever sobre África é uma tarefa difícil. Cito apenas três exemplos, curiosamente todos eles “baseados” em factos reais: (1) «O Sonho do Celta», de Mario Vargas Llosa. Exaustiva reconstituição histórica, mas com sérios erros de percepção epistemológica que resultam no pecado da colonização da própria narrativa. Veja-se os recursos semânticos usados pelo autor quando tenta recriar o antigo Congo belga. Tão desastroso que nem parece vir um escritor peruano. Não admira que o acusem de mercenário de causas políticas; (2) «O Cemitério de Praga», de Umberto Eco. Alguns críticos portugueses, que devem ter lido apenas as primeiras páginas do livro, falam em terrorismo intelectual. Talvez sim… precisamente nas primeiras páginas. Mas Eco foi muito mais longe. O problema é que, ao longo da extensa justificação histórica feita pelo autor sobre um suposto plano diabólico posto em marcha com vista à hegemonia hebraica à escala global, fica a misteriosa sensação, na narrativa, de que a Ocidente os ecos do Islão não passaram disso mesmo, de meros ecos inconsequentes. Estranho e redutor; (3) «Rio de Sangue», de Tim Butcher. Escrita empolgante, simples, em registo de crónica de viagem, com um evidente e forte background de conhecimentos adquiridos no terreno através de experiências pessoais. Interessante. Contudo, funesto na percepção de África, em particular da complexidade de olhares que coabitam, e se digladiam, na República Democrática do Congo. É que pôr o assunto nas mãos de um jornalista, habituado a relatar acontecimentos apenas perceptíveis na linguagem ocidental, mais não é do que fazer a apologia da já estafada supremacia imperialista.
    Moral da história e já Saramago o dizia: não basta olhar. É preciso saber ver, com esse olhar. O olhar de fora e o olhar de dentro. Essa é a missão. E o grande desafio.

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