Victor Eustáquio - Portugal
Vera Falcão Martins é provavelmente um nome que nada dirá à maioria dos
leitores dos PALOP (tal como o de Ryta Vinagre, no caso particular do Brasil).
Mas Stephenie Meyer diz. E muito. Bem ou mal, «Crepúsculo» e a panóplia de
sucedâneos são livros que têm feito sensação no meio literário mundial. O que
poucos decerto se lembram é que a popularidade internacional destas obras
deve-se também ao trabalho “esquecido” de figuras como Vera Falcão Martins, a
tradutora do romance para a língua portuguesa. E o curioso é que quem se der ao
trabalho de comparar o original em inglês com a edição portuguesa rapidamente
chegará a uma conclusão: Vera Falcão Martins fez milagres com a prosa patética
e infantil da escritora norte-americana. Contudo, coloca-se a questão: deve
reclamar o mérito? É que, se nesta situação concreta, o resultado é um texto
francamente superior, a tradutora não deixou por isso de cometer um pecado: a
adulteração, reescrevendo, mesmo que escudada pela interpretação do suposto
alcance semântico perseguido por Meyer.
É o drama das traduções. Que tem igualmente uma possibilidade inversa; a total
incapacidade de compreender e traduzir os sentidos que correm pelas palavras
dos autores. Sobretudo quando escritas em contextos potencialmente menos
ininteligíveis no quadro da dominação histórica das línguas ocidentais para a
comunicação global. Que o digam os autores africanos que escrevem em português,
mesmo pondo de lado aqui o malfadado (des)acordo ortográfico. Será que os
musseques de Luanda poderão ser traduzidos por «slums», quando até na mesma
língua, em português, correspondem a uma realidade diversa de outros «slums»
como por exemplo as favelas do Rio de Janeiro ou as villas de emergencia de
Buenos Aires?
É
certo que uma tradução é sempre uma reconstrução, porque implica a intervenção
de terceiros. Mas rever-se-á o autor nela? Senão, que condições são necessárias
para que assim seja? Fica o desafio e o desejo de voltar ao assunto.
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